NOTÍCIAS

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A tarde caminhava para a noite, e eu caminhava para a vida. Pacífica e calma era a tarde e em nada lembrava os rumores de guerra, a violência dos homens e a fome sobre a terra.
Mas havia a umidade em baixa e um cinza construído, de descuido constituído. E o cinza tingiu o horizonte, abraçou os prédios e pousou no que havia.
De cinza se vestiu o capim estralando securas, mas com a bravura ainda verde que requer a sobrevivência, como a flor insistindo em ser flor, contrariando as circunstâncias. Só a menina tinha a primavera em suas mãos e nem se deu conta.
Distraída, pisei a notícia que já não era nova e empoeirada virava história, e descobri abandonado um segredo alheio que guardei comigo.
Silenciosa me acompanhava a calçada, onde o rapaz conversava com as mãos e sorria com olhos de encanto. E foi sem causar incômodo, que testemunhei um abraço demorado, como quem se perde no tempo, como quem se encontra no outro.
E foi assim, em duas voltas, uma caminhada e um desejo antigo de alongar a existência e não perder nada, ainda mais de uma tarde, que apesar de cinza, cabia esperança.
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DROMEDÁRIO

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A atmosfera no trânsito é feita de combustão e pressa, e um ruído, como se tudo fosse urgência. É um intenso, um imenso mar de máquinas inquietas e rotações de imprudências. É um risco, um estalo, uma seta envenenada de descaso.
Hoje vi uma campanha estampada em um ônibus “ Motorista proteja o ciclista”.
No que vi, senti que era de uma grandeza e de uma beleza triste, porque ainda é preciso que se rogue por respeito a vida.
No retrovisor, um carro e outro carro e surge um dromedário volante no asfalto. Adiante, em frente a esteira onde passarela a vida, ergue-se rígida uma flor de aço, de uma candura fina e estática, ornando o dia e iluminando os passos da noite. E ainda, o assombro, um susto; o motoqueiro e seus malabarismos entre dois carros retorcidos.
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PREGUIÇA


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Hoje é domingo, não peço cachimbo de barro, nem jarro de ouro. Peço mais meia hora na cama. Quero aproveitar o temperamento do meu planalto, que hoje deu a soprar um vento seco, meio frio meio quente,  entrando matinal pela minha janela, como que um duelo entre o inverno e primavera ou coisa como se outono e verão não suportassem o tempo da espera. Coisas do planalto.
Então, vou aproveitar que por hoje tudo é domingo, pra largatear na cama por mais meia hora. Vou deixar estar cada minuto dos trinta que me dou e espreguiçar bem e demorado, como um bom domingo merece, e depois, depois uma prece.

Tomar café só mais tarde e mais tarde também os afazeres, porque apesar de ser domingo, a gente sempre tem. Mas por agora, me jogo inteira na cama, afundando em preguiça dominical, por mais meia hora. Amém.
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