EXPEDIÇÃO II

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Tem umas coisas que agente aprende e não esquece mais. Tem certas coisas que adentram nosso ser, permeiam nossa história e grudam em nós e nós nos apegamos a elas. E falo de coisas simples, coisas singelas que passam despercebidas na grandeza de tantos outros fatos na nossa vida, da nossa trajetória.
E vejam só que um dia, mais um desses dias perdidos no passado, agasalhados nos cômodos da memória, aprendi algo que achei simplesmente bonitinho; mas bonitinho assim, de perfeito, de tocante, de encantador. Só não me lembro quem me entregou essa preciosidade, mas agradeço imensamente pelo grandioso ensino que guardo até hoje. Trata-se de uma expressão, mais conhecida nas cidades do interior, acredito eu. É o "caminho do lá vai um", ah, eu sei que até soa bobo, mas é que eu sou assim mesmo, boba, bobona e tem umas coisas bobas que me comovem.
Foi realmente, não minto, uma grande descoberta pra mim saber que aquela estradinha desenhada no mato de tanto a gente andar é o caminho do lá vai um.
Quando criança, mesmo andando em bando no cerrado, colhendo as frutinhas do mato, quando aparecia a estradinha, não tinha jeito, era fila indiana mesmo, e lá vai um!
E lá vai mais um, atrás das frutinhas do mato. À medida que íamos passeando, brincando, explorando a imensidão da nossa infância, íamos também experimentando os sabores que a natureza nos disponibilizava. E essas frutinhas, são achados maravilhosos. Eram como delícias disponíveis em um pomar, sem cerca, sem limites e sem dono. Era de todos nós.
Sei que muitos não desfrutaram desses prazeres, mas eu e meus irmãos sim, claro que sob a consultoria da minha mãe, que entendia muito das plantas do cerrado.
Será que alguém aí sabe o que é o sangue de cristo? Dessa provei muitas vezes. E a bananinha? Azeda!!! E o talo do coquinho do mato, delícia! De algumas flores sugamos quase que mel! Ah, era tudo uma grande aventura.
E tem algo ainda muito interessante, mas não é de comer, é de ver e sentir. É a "Maria Fecha a Porta", uma plantinha sensitiva, conhecida também como planta tímida. Gente, mostrei pra Lulu uma que nasceu aqui perto de casa, ela ficou muito emocionada. E como, como não ficar? Não tem como não se emocionar, vendo a plantinha tão educada e tímida fechando suas folhas após um toque, como mãos espalmadas em prece, ou uma janela de dois lados... aquelas que deixam as casas com cara de poema.
Tem umas coisas simples que agente não esquece. São essas coisas, que eu não quero esquecer, jamais.
Agora, todos os dias a caminho da escola, a Lulu passa pra ver a Maria fecha a porta.o
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